domingo, 6 de junho de 2010

JORNALISMO E NOVAS TECNOLOGIAS

Com as novas tecnologias o jornalismo passa por transformações indispensáveis e torna-se fundamental discutir a sua realidade contemporânea, num fluxo de informação ininterrupto, numa aldeia global. A rigor, como é produzir notícias neste universo social de complexidade? A internet cria um novo espaço para a comunicação? 

O que de fato deve afirmar é que as novas mídias promovem mudanças na atualidade e aponta para novos rumos comunicacionais. Vale a pena o debate que está sendo feito e deverá render ainda muitas discussões e novos caminhos. Entrevista Revista Cult on-line traz uma boa análise sobre o tema, com Zuenir Ventura, acessado dia 6 de junho de 2010.

O jornalismo do século 21

Zuenir Ventura discute o jornalismo praticado nos últimos 10 anos
Publicado em 01 de junho de 2010

Zuenir: Em todas as instâncias desse país nós vivemos uma espécie de desprezo pela expressão verbal

*Por Wilker Sousa
Fotos: Anderson Silva

Notícias produzidas em tempo real na tentativa de apreender um mundo complexo cujas fronteiras, em face do universo digital, há muito desapareceram. Lidar com tecnologias que ampliam o acesso à informação e ao mesmo tempo restringem a notícia a textos exíguos. Essas são algumas das questões que vêm à tona quando se propõe discutir a atividade jornalística contemporânea.
Na tarde do último sábado (29), esse foi o tema do debate Cena Contemporânea – O jornalismo dos Primeiros 10 anos do século 21, presente no XIII Fenart (Festival Nacional de Arte), realizado em João Pessoa. Ao longo de três horas, os jornalistas Marcela Sitônio, Jô Mazarollo e Gonzaga Rodrigues (da imprensa local) juntamente com o jornalista e escritor mineiro Zuenir Ventura analisaram os impactos das tecnologias recentes no cotidiano do jornalista e em que medida suscitam novas maneiras de se pensar e de se fazer jornalismo. Ao final do debate, Zuenir Ventura concedeu entrevista à CULT, leia a seguir.

CULT – Em tempos de twitter e da avalanche de informações a que o indivíduo é submetido, ainda há público leitor para grandes reportagens?
Zuenir Ventura – Eu acho tudo isso melhor do que não escrever e melhor do que não ler, mesmo sabendo da precariedade do texto. É melhor porque você se habitua a ler e amanhã lerá outras coisas. Recentemente, li sobre o episódio de um jovem que mal sabia escrever e começou a ficar isolado de sua turma porque todo mundo se comunicava via e-mail. Ele ficou desesperado e aprendeu a escrever para passar e-mails para os colegas da turma. Então, é melhor assim do que se não houvesse nada.

Mas é claro que isso não pode ser um processo pernicioso, ou seja, a gente não pode reduzir o mundo a 140 toques. Tem coisa que pode ser escrita em 140 toques, outras não. Eu também acho que a grande reportagem não é necessariamente uma reportagem grande, mas apenas há assuntos que necessitam de mais espaço, de mais tempo, de mais apuração, ou seja, a diferença de uma matéria está em como foi feita a pesquisa, a apuração, o trabalho com o texto. Por que as matérias de jornalismo literário são melhores? Porque se tem mais tempo para trabalhar, mais espaço e isso exige uma qualidade maior na feitura do texto.

CULT – Sim, mas esse leitor habituado ao twitter ou aquele que lê notícias curtas na internet, esse tipo de leitor leria uma revista com boas e extensas reportagens? Ainda há espaços para publicações desse gênero?
Zuenir – Eu acho que sim. Por exemplo, quanto mais plural for o jornal, não só politicamente e ideologicamente, mas tecnicamente também, ele pode contemplar esse leitor, embora não seja hegemônico. Se você puder dar a esse leitor um pouco desse tipo de matéria, eu acredito que tem aceitação. Eu não sei o percentual desse leitor, mas existe, tanto que a revista Piauí está aí.


CULT – Ao invés de suporte, você acredita que essas novas tecnologias têm se tornado protagonistas das matérias feitas hoje em dia?
Zuenir – Para não fazer uma afirmação absolutamente radical, eu diria que há esse perigo, esse risco de se transformar um instrumento, um meio de pesquisa, em protagonista de uma matéria. Uma amiga minha atriz reclamou dizendo que há jornalistas que chegam com a matéria pronta, pegam algumas aspas e está tudo resolvido. Não é para isso. O Google foi inventado para começo de conversa, é para se iniciar a matéria a partir dele, mas não para se fazer tudo.




Zuenir: O Google foi inventado para começo de conversa, é para se iniciar a matéria a partir dele, mas não para se fazer tudo

CULT – Como falamos anteriormente, hoje vivemos sob um bombardeio de informações, e, como provável conseqüência disso, o jornalista acaba se preocupando muito com a informação e deixa de lado o apuro com a língua. Você acredita que falta por parte dos jornalistas um maior esmero com a língua portuguesa?
Zuenir – Eu acho que sim. Hoje nós temos uma crise da palavra escrita em todos os níveis. Não só no jornalismo, mas também na universidade, no congresso nacional, em todas as instâncias desse país nós vivemos uma espécie de desprezo pela expressão verbal. Ora, isso no jornalismo é grave, pois esse é o nosso material, essa é a nossa matéria-prima.
Nós temos três dimensões no jornalismo: estética, técnica e ética. A dimensão estética requer um bom texto, mas segundo as peculiaridades do jornalismo. Nem sempre um texto literário é um bom texto jornalístico. É preciso saber que há uma especificidade da nossa profissão.

CULT – Costuma-se ter uma visão romantizada e nostálgica do jornalismo praticado décadas atrás, especialmente com relação às grandes reportagens. Porém, embora enfrente muitas dificuldades, o jornalismo atual simboliza, a seu ver, uma evolução em relação àquele praticado nos anos 1950 e 1960?
Zuenir – Acho que sim. Primeiramente, porque vivemos em um mundo complexo, muito mais do que era nos anos 1950 ou 1960, portanto um mundo muito mais difícil de ser apreendido. É também complexo por conta da velocidade, dessa necessidade de se produzir informação em tempo real.

Existe algo que eu vejo especialmente entre jovens, que é uma espécie de nostalgia do não vivido. Olha-se para trás e se diz: “O jornalismo era mais romântico”. Não, o jornalismo era péssimo nos anos 1950. Basta ler o livro do Fernando Morais (Chatô, o rei do Brasil) para ver o que era. Ética, por exemplo, era uma palavra que não frequentava o vocabulário do jornalismo daquela época. Isso é muito recente. Sobre a condição do jornalista: ele era muito despreparado e por isso mesmo, como não tinha nenhuma autonomia profissional, ele precisava fazer bico. Era muito comum ter o jornalista cobrindo a repartição pública de onde ele era funcionário, tinha muito disso.
Então é preciso olhar para trás sem saudosismo e sem idealização. Teve muita coisa boa, mas não era tudo isso não. Há coisas melhores hoje. Por exemplo, hoje a ética é uma preocupação nas redações, ao contrário do era antigamente.

domingo, 30 de maio de 2010

INTERCOM E O DEBATE DE IDÉIAS

Em suma, nos grandes eventos acadêmicos, o que não pode faltar são as divergências, de fato salutares. Sem dúvidas, nem todos escrevem e lêem pelas mesmas cartilhas e isto torna estes momentos indispensáveis e fundamentais.
Imagem Luciana Machado
Prof. José Marques de Melo em palestra na abertura do evento
 












CIÊNCIA - A Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), realizada na UFG entre os dias 27 e 29, conseguiu o seu objetivo de levar conhecimento e debate científico à comunidade acadêmica (pesquisadores, professores e estudantes) do curso de comunicação social, dividido em suas habilitações: Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas. O que chamou a atenção nos três dias foi a participação dos alunos de diversas instituições, não somente de capital do estado, mas de outros municípios, o que demonstra o interesse pela ciência, apesar dos signos dizerem o contrário. Evidentemente, que o número de pessoas participantes estaria aquém do desejado, entretanto, este não é um território a ser seguido por uma maioria em tempo de mercados fortes e imediatos.

Importante notar, entretanto, a busca pela ordenação de um discurso por parte de muitos intelectuais, possivelmente uma revisão às propostas de um marxismo que insiste com definições que contrariam as prerrogativas mercadológicas desse século. O ilustre professor Marques de Melo na sua abertura não deixa dúvidas quanto à importância das atividades nos laboratórios nas faculdades de jornalismo, considerando os anseios dos estudantes em buscar rapidamente o mercado ao termino do curso, como tem ressaltado o pensador em outros momentos, nem todos serão pesquisadores. Desta vez, citou a sua experiência própria de um aluno que não teve a experiência enquanto graduando dos laboratórios que, segundo ele, aproxima o futuro profissional com as lidas práticas, eficientemente.

Em uma análise, com ênfase na sua discussão histórica do jornalismo com a habilidade que lhe é peculiar Melo retratou a televisão, onde destacou Assis Chateaubriand (Diários Associados) e Roberto Marinho (Rede Globo), duas personalidades elogiadas pelos feitos à comunicação brasileira, mas ao mesmo tempo contestadas ante as suas maneiras pouco éticas de tratar a informação. O primeiro, durante sua existência profissional usou métodos com pouca lisura para tratar amigos e inimigos, inclusive chantageando empresários para obter recursos e formar o seu conglomerado, o maior da sua época, sem concorrência, além de seus textos que reverberavam interesses particulares, sobretudo na política, em detrimento da coletividade.

O segundo, por sua vez, é sabido a sua proximidade com os governos autoritários, a iniciar com o grande escândalo Globo Times Life, no início da década de 60, numa estratégia que deu certo de burlar as leis vigentes para obter vultosos recursos da empresa estadunidense, o que permitiu a Rede Globo torna-se o que é hoje, um grande conglomerado das comunicações. Importante destacar que não houve qualquer sanção devido ao apoio recebido pelos militares quando foi julgada pelo Congresso Nacional. Para tanto, leu pela cartilha dos governos autoritários que exterminou brasileiros contrários ao regime, inclusive jornalistas. O apoio do conglomerado aos militares durou até o último instante de sua derrocada em 1985.
Imagem de Luciana Machado
 Prof.  Nélia Del Bianco (UnB) discute as  mídias de  hoje.
O pensamento dos funcionalistas americanos, reproduzido pelo espanhol Ortega y Gasset, citado por Melo na abertura do evento, que tem uma visão de uma sociedade de massa, por vezes gera contestação e pode arremeter a imaginar a existência de indivíduos desarticulados e alienados, e para tanto se deve adequar o jornalismo, por exemplo, a esta proposta, de maneira a promover o fluxo de informação que permita a sociedade se formar conforme um sistema estabelecido. Deste modo, a mudança seria difícil e complexa diante de uma sociedade que pouco pensa e segue rumos estabelecidos pelos comunicadores, guiados por uma lógica, neste contexto, de mercado, a essência da modernidade. Conforme Gasset, no livro “A Rebelião das Massas” as minorias são indivíduos ou grupos de indivíduos especialmente qualificados. A massa é o conjunto de pessoas não especialmente qualificadas. Não se entenda, pois, por massas só nem principalmente "as massas operárias". Massa é "o homem médio".

Em suma, nos grandes eventos acadêmicos, o que não pode faltar são as divergências, de fato salutares. Sem dúvidas, nem todos escrevem e lêem pelas mesmas cartilhas e isto torna estes momentos indispensáveis e fundamentais.